Tem filme que chega de mansinho, senta do nosso lado e sussurra: “você lembra disso aqui?”. O Agente Secreto, novo longa do Kleber Mendonça Filho, faz exatamente isso — só que com a sutileza de um megafone no meio da rua. E tudo bem: tem hora que a cultura precisa levantar a voz mesmo.

O diretor, que já é praticamente um patrimônio afetivo do cinema brasileiro, mergulha num thriller político que não tem medo de cutucar feridas antigas. A história se passa nos anos de ditadura e tudo gira em torno de vigilância, paranoia, silêncio e aqueles pactos sociais meio tortos que a gente finge que não existem. É um filme de suspense, claro, mas também é um convite a revisitar partes da nossa história que às vezes preferimos deixar empoeiradas numa gaveta.

E aí entra o charme da coisa: Kleber não entrega um “filme aula”, daqueles que parecem seminário da faculdade às oito da manhã. Ele monta um quebra-cabeça estético potente — câmera que observa e espia, enquadramentos que fazem o coração acelerar, interpretações afiadas — tudo a serviço de uma sensação muito específica: a de estar sendo visto. E cá entre nós… poucas metáforas são tão perfeitas pra falar do Brasil quanto essa.

Mas a graça não está só na narrativa. Está na lembrança de que cinema é, sim, memória viva. Quando um filme como O Agente Secreto chega às telas, ele abre porta para conversas necessárias: sobre autoritarismo, sobre os silêncios que engolimos, sobre como a cultura registra o que muitas vezes os livros oficiais tentam apagar. No fundo, é a velha batalha entre lembrar e esquecer — e o cinema, felizmente, costuma ficar do lado certo.

Pra nós, que acreditamos que cultura é ferramenta de transformação e que audiovisual é linguagem de resistência, esse filme vira quase um manual do “por onde começar”. Ele não só provoca, mas inspira: mostra que a câmera é arma, ponte e espelho ao mesmo tempo. E que quando a gente olha pra trás com honestidade, dá até pra caminhar melhor pra frente — ainda que tropeçando um pouco no caminho.

Se você gosta de obras que cutucam, instigam e deixam aquela coceira intelectual gostosa, prepare a pipoca. O Agente Secreto não é só um filme: é uma conversa necessária. E, como toda boa conversa cultural, começa no cinema… e termina dentro da gente.

O Agente Secreto: quando o cinema cutuca a memória e faz a gente pensar de novo

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